segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Copom, PIB e o "chororô"

Copom, PIB e o "chororô"

Antonio Corrêa de Lacerda
De São Paulo

"Quando a realidade muda,
minhas convicções também mudam"

(John Maynard Keynes, 1883-1946)

A frase em epígrafe, do mais importante economista do século vinte, foi uma resposta a um interlocutor que o questionou porque havia mudado de opinião. É uma boa ilustração do momento vivido pela economia brasileira e das ações que temos que tomar para enfrentar os enormes desafios impostos pela nova realidade internacional de menor crescimento econômico, talvez recessão em muitos países, fase prolongada de juros muito baixos, até mesmo negativos e "guerra cambial" explicita.

A recente decisão do Copom (Comitê de Política Monetária) de reduzir em 0,5 ponto percentual a taxa básica de juros e sinalizar que ela continuará em queda gerou uma grande discussão. De um lado, representantes do mercado financeiro aludindo uma improvável ingerência política na decisão. Do outro, muitos que, como eu, viram coerência e determinação na decisão correta.

O fato é que, interesses específicos à parte, o melhor mesmo para o País é adaptar rápida e antecipadamente o conjunto da política econômica para os "tempos bicudos" que se apresentam. É importante que haja previsibilidade, como querem alguns, nos movimentos das medidas econômicas, mas não podemos nos tornar reféns dela, nem mesmo torná-la instrumento de ganhos especulativos fáceis e sem risco, em detrimento do que é melhor para a Nação.

Assim, fez muito bem o Banco Central do Brasil (BCB) em considerar as novas circunstâncias, de uma economia internacional que está se deteriorando. É muito fácil criticar a decisão baseando-se unicamente nos indicadores passados. O difícil é perceber a dinâmica das variáveis e como elas impactarão os níveis de atividades, de preços e demais indicadores no futuro próximo.

Especialmente nos momentos de grande transição como o que enfrentamos, isso se torna ainda mais desafiador e é preciso contar com boas análises e ousadia para tomas as decisões mais acertadas.

Portanto, criticar a decisão de reduzir os juros com o argumento que a inflação acumulada nos últimos doze meses ultrapassou o teto de tolerância da meta, de 6,5%, é uma visão equivocada. Por varias razões:

Primeiro, porque inflação elevada não é uma particularidade brasileira. O mundo viveu até recentemente uma pressão de elevação de preços. A inflação acumulada em 12 meses é de 6,4%, na China. Há ainda países com inflação mais elevada que a nossa, como a Índia, com 8,7%, a Rússia, com 9,4%, a Argentina, cuja inflação oficial é de 9,7% e a campeã Venezuela com 24% !;

Segundo, porque inflação em alta é um fenômeno com data marcada para terminar. Assim que o cenário de desaquecimento, talvez recessão, se consolidar em economias como EUA, Europa e Japão, que representam mais da metade do PIB mundial, os preços vão cair. Se no passado recente tivemos o efeito da pressão inflacionária internacional, a direção vai se inverter, com a desinflação vinda de fora;

Terceiro, porque o nível de atividades da economia brasileira está em franca desaceleração e isso não se trata de um prognóstico. Basta verificar a evolução dos indicadores. O PIB brasileiro que vinha crescendo em doze meses a 9% no segundo trimestre do ano passado foi se desacelerando e subiu apenas 3,1% no segundo trimestre deste ano. Se nada ficarmos inertes, teremos uma recessão desnecessária à frente !;

Quarto: apesar da queda, continuamos no topo do "campeonato mundial de juros reais", muito distantes do segundo colocado e, mais ainda, da média mundial. Ficar nesta posição, com o mundo desenvolvido em crise, significará, além da queda do PIB, valorização adicional da taxa de cambio, desincentivo ao investimento produtivo e desperdício de recursos públicos para financiar a divida publica.

Portanto, nos deixemos impressionar pelo chororô de alguns analistas e operadores do mercado financeiro que tentam desqualificar a decisão do BCB e intimidá-lo para os próximos passos. Os membros do Copom já demonstraram sua independência, não apenas em relação ao Governo, mas também e principalmente, frente às pressões advindas de vozes nem sempre comprometidas com o interesse geral, mas segmentado.

Antonio Corrêa de Lacerda é professor-doutor do departamento de economia da PUC-SP e autor, entre outros livros, de "Globalização e Investimento Estrangeiro no Brasil" (Saraiva). Foi presidente do Cofecon e da SOBEET.

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